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Imprevisibilidade na resolução de conflitos: a morosidade dos processos

Imprevisibilidade na resolução de conflitos: a morosidade dos processos

A morosidade judicial tornou-se um dos fatores estruturais que comprometem a confiança no sistema de Justiça brasileiro. A percepção social sobre a lentidão processual é majoritariamente negativa e reforça a ideia de que “ganhar uma ação não significa receber”, especialmente no âmbito trabalhista e na fase de execução. 

Além disso, a demora excessiva compromete a efetividade da tutela jurisdicional, favorece comportamentos estratégicos abusivos e gera insegurança jurídica prolongada.

Entendendo a morosidade dos processos

A morosidade processual é uma falha estrutural do sistema de Justiça brasileiro e representa um dos principais fatores de descrédito institucional. 

Embora prevista na Constituição Federal a garantia da razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII), sua concretização ainda esbarra em entraves operacionais, excesso de litigiosidade e comportamentos estratégicos que prolongam artificialmente a tramitação. 

Trata-se de um fenômeno multifatorial, alimentado tanto por deficiências na gestão processual quanto pelo uso abusivo de recursos e incidentes protelatórios por parte de litigantes.

Ragazzo (2025, p. 69) descreve esse cenário com precisão ao afirmar:

“Esse acúmulo de processos pendentes é o principal fator que gera a maior divergência nos prazos de resolução e contribui para o inchaço da máquina judicial trabalhista, criando um ambiente de morosidade e descrença no sistema.”

A morosidade processual torna-se ainda mais crítica após a fase de conhecimento. Mesmo quando a sentença transita em julgado, a efetiva satisfação do direito enfrenta entraves significativos na etapa de execução, sendo frequentemente utilizada como espaço para manobras dilatórias e incidentes processuais que retardam o cumprimento da decisão.

Além dos aspectos estratégicos e processuais, a morosidade também é perpetuada pela ausência de mecanismos eficazes de coerção patrimonial e pela dificuldade de localizar bens penhoráveis, especialmente diante de estruturas empresariais que adotam engenharia patrimonial para ocultação de ativos. 

Assim, processos que deveriam ser instrumentos de pacificação social tornam-se apenas uma etapa formal de disputa, sem previsão real de desfecho útil.

Esse contexto reforça a necessidade de repensar o papel do Judiciário na garantia da efetividade da tutela jurisdicional. Não basta decidir: é preciso entregar resultados. A previsibilidade processual, requisito de segurança jurídica, não pode ser exceção, mas sim elemento central da jurisdição.

A questão das execuções nas ações trabalhistas

A execução trabalhista é reconhecida como uma das etapas mais sensíveis e problemáticas do processo judicial brasileiro. 

Mesmo após o reconhecimento do direito na fase de conhecimento, a satisfação do crédito enfrenta entraves práticos que geram prolongamento indevido da tramitação processual. A dificuldade em localizar bens penhoráveis, somada a comportamentos processuais protelatórios, contribui para que a execução se torne um procedimento longo, oneroso e, muitas vezes, ineficaz.

Ragazzo (2025, p. 80) chama a atenção para esse fato ao afirmar:

“Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), as execuções representam o maior foco de congestionamento do Poder Judiciário, com as execuções fiscais sendo identificadas como o principal gargalo. Ainda que o CNJ tenha adotado medidas para enfrentar esse problema no âmbito fiscal, o cenário revela que, também na Justiça do Trabalho, a fase de execução continua sendo um ponto crítico que compromete a efetividade da prestação jurisdicional.”

Ainda que tenham sido incorporadas novas tecnologias de constrição patrimonial (como SISBAJUD, RENAJUD, INFOJUD e SNIPER), tais ferramentas não eliminaram a morosidade executiva. 

Parte do problema decorre da capacidade de muitos devedores estruturarem estratégias patrimoniais de blindagem e ocultação de ativos, o que dificulta a efetiva recuperação do crédito.

 Soma-se a isso a prática recorrente de incidentes protelatórios e medidas processuais sucessivas empregadas como meio para ganhar tempo e transferir ao credor o ônus do prolongamento do processo.

Do ponto de vista processual, a execução trabalhista sofre os efeitos de um sistema que prioriza a formação do título judicial, mas não dispõe de mecanismos suficientemente eficazes para torná-lo exequível. 

Isso gera disparidade entre o direito reconhecido e o direito realizado, que é uma das principais críticas da doutrina contemporânea e ponto central de preocupação do CNJ e do STF no debate sobre efetividade processual.

Desvalorização do crédito trabalhista

A demora no cumprimento de decisões judiciais produz efeitos graves sobre a economia do processo e, especialmente, sobre o credor. 

Como alerta Ragazzo (2025, p. 78):

“Esse contexto fortalece o incentivo à má-fé por parte das empresas reclamadas, que utilizam a litigância protelatória como estratégia para desvalorizar créditos trabalhistas. Ao prolongar deliberadamente a tramitação dos processos, essas empresas elevam a pressão financeira e emocional sobre o trabalhador, forçando-o a aceitar acordos em condições extremamente desfavoráveis.”

Essa prática transforma o processo judicial em um instrumento de desgaste econômico deliberado. Em vez de buscar a solução da controvérsia de maneira legítima, empresas calculam que “ganham mais” esticando procedimentos, multiplicando incidentes e apresentando recursos infundados. O tempo, então, torna-se uma moeda de barganha.

Além disso, a desvalorização do crédito é prática conhecida: o trabalhador é frequentemente pressionado a aceitar deságios de 70% ou mais para antecipar valores. Isso representa uma violação indireta ao princípio da dignidade da pessoa humana e à função social do crédito trabalhista.

Ações e tendências

O enfrentamento da morosidade judicial exige soluções sistêmicas e coordenadas. Entre as iniciativas mais relevantes observadas atualmente, destacam-se:

  • Adoção de técnicas de execução patrimonial mais agressivas como o uso do SNIPER (Sistema de Busca de Ativos).
  • Saneamento processual e calendários executivos: implementação de rotinas que reduzem incidentes e movimentações inúteis.
  • Combate à litigância de má-fé empresarial: aplicação de multas mais severas para estratégias protelatórias.
  • Estímulo a meios alternativos de satisfação do crédito: como a cessão de crédito trabalhista, reconhecida pelo STF no Tema 361 como juridicamente possível e compatível com a execução trabalhista.
  • Digitalização e inteligência processual: automação da busca de bens e gestão eletrônica da execução.

Portanto, a execução precisa deixar de ser o lugar do fracasso jurisdicional e passar a ser tratada como fase central do processo, não apenas como etapa residual.

Conclusão

A imprevisibilidade na resolução dos conflitos e a morosidade processual enfraquecem a confiança no Judiciário e comprometem a efetividade das decisões, especialmente no âmbito trabalhista. 

O atraso injustificado beneficia devedores resistentes e abre espaço para práticas protelatórias, produzindo efeitos econômicos e sociais graves. A execução não pode continuar sendo a “etapa esquecida” do processo: deve ser tratada como núcleo de realização do direito e não como mera formalidade.

É indispensável que operadores do direito adotem soluções que reduzam o desgaste processual e acelerem a satisfação do crédito, com segurança jurídica e controle jurisdicional. A efetividade, princípio fundamental do processo, não se alcança com sentenças, mas com resultados.

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Referências Bibliográficas

RAGAZZO, Carlos. Cessão de Créditos Trabalhistas, Autonomia do Trabalhador e Democratização do Acesso ao Crédito: Um Enfoque Jurídico-Econômico. São Paulo: Editora JusPodivm, 2025.

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